Uma Chamada Perdida


O telefone tocava incessante,
era o passado tentando levar
o que restou, levar meus
últimos segundos de folego
antes da insanidade evidente.
Atendi e houve só silencio,
as lagrimas caiam naquela
escuridão sem palavras,
não havia nada a ser dito,
só senti que cai ao chão
quando o silencio se quebrou,
era o bipe seco do telefone.

Dezembro


Ela pegou suavemente na minha mão,
foi algo natural, quase surreal,
logo deu uma volta em torno de si mesma
segurando a ponta dos meus dedos,
como se tivesse dançando só pra mim,
uma bailarina particular, realmente
naqueles poucos segundos só havia ela.
A porta da sala estava aberta,
ninguém se importou em fechar,
não havia pra que esconder
nossa felicidade, era uma linda
noite calma de dezembro,
ela recostou a cabeça em
 meu ombro, e se encaixou
debaixo dos meus braços.
Ela se levantou e foi até a janela,
a luz da rua brilhava atrás dela,
era a mais linda de todas,
eu sabia, ela iria acabar com
meu coração, mas não podia resistir.





Imagem : Fabricio Panchone.

Viver (morrer) de amor


Existem milhares de formas de morrer,
mas acho que a mais dolorosa
deve ser pelo amor, amar nos mata,
é algo tão involuntário como respirar,
quando menos espera esta amando,
e também esta sofrendo.
Naquela manhã acordei sem teu cheiro,
havia adormecido na cozinha, encima
da mesa agarrado com a tua carta,
agarrado com o que sobrou de você.
A geladeira estava vazia a dias,
e o calendário parado no dia 12,
todo dia era o maldito dia 12,
por mais que eu me esforçasse
suas palavras não mudavam
na carta, nem uma virgula.
As flores que eu te dei morreram
na janela, de coração partido,
 barriga vazia, e olhos cheios,
 cheios de lembranças, tão cheios
 que transbordam pelo meu rosto,
maldito amor, maldita dor,
é o preço que se paga por amar,
por viver.





Imagem: Jil Norberto.

Paris


Nós não pertencíamos
um ao outro, nunca
foram ditas palavras
tão sinceras, ela era
de um mundo maior,
que o meu pequeno
coração adolescente
não suportaria.
Eu imaginava nossas
viagens pelo mundo
enquanto voltada
para casa, da janela
do ônibus podia ver
Paris, podia ver seu
rosto iluminado pelas
luzes amarelas da rua,
podia ver ela tocando
piano em nossa sala de estar,
podia ver uma vida inteira.
Não houve brigas,
nem lagrimas,
como seus lindos lábios
me disseram um dia,
 nós não nos pertencíamos.





Imagem : Marcos Costa.

Auto Retrato


Ela pensou em ser bióloga,
amava a natureza e o ar
seco desses dias ensolarados,
sonhava em ter uma filha,
em viajar o mundo ou
simplesmente ser feliz.
No seu décimo quinto aniversário
ganhou uma pequena
maquina fotográfica,
antiga, de filme ou
como ela gostava
de dizer “uma maquina
com personalidade”.
Se apaixonou por
tudo que a sua lente
capturou a partir daí,
todos os risos, as lágrimas,
os invernos, os corações
partidos pelas esquinas.
Em um desses invernos
eu fui a uma exposição,
se chamava Sonhadores,
parei extasiado em frente
a quarta foto,  se intitulava
“Auto Retrato”.



Imagem : Jennypher Santiago.

Estrelas


Era uma noite melancólica para mim,
não havia vento, nem chuva,
parecia que até as nuvens tinham
companhia para aquela noite.
Uma menina do outro lado do
parque esta sentada como eu,
em um desses bancos velhos de madeira,
não sei quem foi que inventou
que essas coisas são confortáveis.
Eu fiquei olhando pra ela,
mas ela só tinha olhos para o céu,
depois de muito tempo decidi
matar minha curiosidade.
Só quando cheguei perto pude ver,
ela também estava triste,
deve ser efeito colateral dessa noite,
ela olhou nos meus olhos por um instante
e voltou a se entreter com o céu.
- São lindas, não são ?
- O que ?
- As estrelas... elas se parecem
 tanto conosco.
- Por que ?
- Por que elas são cicatrizes no céu.



Imagem : Licínia Machado.

Minha lente embaçada


O vento batia no rosto,
não estávamos muito rápidos,
era o mundo que girava devagar,
nesse balanço minha mão
firmava no volante, na tentativa
inútil de manter o controle.
O som da rua agora era
 nossa rádio particular,
 não sei por que insisto em olhar,
em pecar meus olhos com
essa beleza natural.
Tão linda quanto a rosa
que morreu pra fazer seu cheiro,
era simples, era ela, era a noite.
Estava envolto com um filtro,
como uma velha câmera analógica,
meus olhos clamavam mais,
mas tudo se embaçava a minha frente,
deve ser essa coisa que chamam
por aí de felicidade.




Imagem : Gonçalo Ramos.

Um café, por favor.


Era uma sexta feira e chovia bastante,
um daqueles dias onde todos se escondem
em suas casas com medo do frio e da solidão.
Eu costumava me conformar com a vida,
estar só não era desculpa pra não viver,
resolvi tomar um café aquela noite,
coisa que nunca faço, odeio café,
mas era o único lugar aberto onde
eu poderia escrever meus poemas em
um pedaço qualquer de guardanapo.
Logo que me posto junto a mesa vejo ela,
aos olhos despreparados seria só mais uma,
mas quando a vi eu sabia que era ela,
era pra ela todos esses poemas bobos,
todo esse falso romantismo que eu me empunha,
todas as noites em claro, minhas paginas de
fichário rasgado contavam a nossa historia.
Ouvi sua voz de longe, “um café , por favor”
já me contentaria com menos que isso,
ela sorriu para mim e se foi, abriu a porta
e partiu, sem guarda chuva, sem preocupação,
era feliz com a chuva lavando sua alma.
Desde então toda sexta que chove eu
me posto junto a mesa e peço um café,
abro minha blusa e retiro do bolso este
guardanapo, sorrio sozinho para rua,
eu ainda me lembro por que escrevo poemas.


Imagem : José Rocha.